segunda-feira

A eterna procura;

Como poderia ser tão fácil escrever sobre algo que não sentira? Como tal curiosidade pudera produzir textos e palavras tão tocantes? Sabe, melhor que ninguém que gostaria de escrever sobre a dor e a confusão com veracidade única, fugindo desses lugares comuns tantas vezes antes visitados. Como poderia falar de dor se ela nunca lhe assolou? Acreditava ainda que naquele coração cheio de cascalho, e nunca de amor, viesse a se alojar tal sentimento.
E será então, que deseja sentir isto? Ou seu egoísmo não permitiria, lhe mantendo sempre em sua casca, seu umbigo, seu retrato, seu narcisismo? Algum dia encontraria algum alguém que lhe satisfaça... e complete?

Procura assim em cada esquina a garota que olharia e se apaixonaria: becos, salas, cinemas, parques, ônibus... Lá está ela esticando o pescoço à procura do seu alguém.
Quem seria dessa vez? Quem iria enganar, usar, sentir e no fim, esperar o amor lhe tomar conta? A loira, morena, baixa, gorda? Momentos que se perguntaria: 'agora?' e depois imploraria: 'Amor! EXISTA!' e mais tarde ainda, estaria fazendo quase que uma prece:
'Nasça neste coração frio uma flor colorida, floresça-a! Faça-me frangalhos, use-me, crie borboletas em meu estômago, deixe-me planar pela terra de tanta satisfação...! Erga-me tão alto que eu não possa fazer mais nada do que cair...'

Amor dos anos 60 (Arnaldo Jabor)

Amor dos anos 60 deixava muito a desejar

Eu sou do tempo em que as namoradas não davam. É. Estou enojado dos dias de hoje, nesta torpe função de comentarista, em que as notícias batem-me na cara como pedras. Estou cansado. Volto ao passado, sugado por um túnel de flash-backs. Pois é; as namoradas não davam.

A pílula foi a maior revolução cultural dos anos 60, pois as meninas, com pavor de engravidar, deixavam quase tudo menos o principal e os rapazes iam para casa com dor nos rins e perpetravam masturbações feéricas, ejaculando nos banheiros como foguetes à Lua.

Os meninos de hoje vivem em haréns. Estes "pequenos canalhas" que eu tanto invejo torcem o nariz para deusas de 18 anos, entediados, enquanto, no meu tempo, quantas meninas eu tentei empurrar para dentro de apartamentos emprestados, ficando elas empacadas na porta, quantas unhas quebradas em soutiens inacessíveis, quantas palavras gastas em cantadas intermináveis, apelando para Deus, para Marx, para tudo, desde que as saias caíssem, as blusas se abrissem, as calcinhas voassem. Não havia motéis, então.

Namorávamos em qualquer buraco: terrenos baldios, cantos da praia de noite; eu confesso que já "amassei" uma namorada dentro de uma grossa manilha encalhada na Praia de Ipanema. Os carros eram poucos e deixavam um rastro de silêncio depois que passavam. Havia menos gente. Aconteciam menos coisas.

As pessoas eram mais individualizadas - fulano, sicrano, rua tal, número tal, bar tal, comida tal, um dia depois do outro... Havia tempo para o tempo passar.

Mas, deixemos de filosofias e fiquemos na sacanagem. Minha primeira namorada não era mais virgem.

Era uma raridade. Era uma morena febril, agressiva que dirigia uma Rural Willis do pai. Eu, que vivera até então na horrenda divisão entre puteiros e romances líricos, entre lágrimas e baldes de despejo, achei que ia começar meu primeiro amor adulto.

Mas, acontece que minha namorada resolvera reconstituir sua virgindade, recusando-se a perpetuar comigo seu "erro" do passado.

Arrependera-se de ter cedido uma única e sangrenta vez ao "canalha" que me antecedera e, depois de lágrimas em confessionários, resolvera manter sua pureza intacta.

Para mim, foi um calvário de desejo insatisfeito. Na Rural Willis do pai dela, quase tudo era permitido, mas tudo sôfrego, apavorado, desespero e gozos no ar, ejaculações no painel - nada terminava. O apartamento era a grande esperança; se a menina entrasse, depois era mole. O problema era entrar.

"Não, não adianta, Arnaldo, aí eu não entro!..." Eu, jovem comuna, tinha a chave de um "aparelho" secreto do Partidão, ali na Rua Djalma Ulrich, com um sofá-cama rasgado com o algodão aparecendo, para onde eu, da "base" cultural da UNE, tentava levar, sem sucesso, menininhas de esquerda, com triplo medo: sentimento de culpa, medo de broxar e de ser apanhado pelos comunistas "caxias".

"Não. Aí eu não entro!", gemia minha namorada. Eu tentava argumentos que iam de Sartre e Simone até a revolução. "Mas, meu bem... deixa de ser 'alienada'... A sexualidade é um ato de liberdade contra a direita..." E ela: "Não entro! Isso seria também uma indisciplina pequeno-burguesa."

"Mas, meu anjo - eu suplicava -, não há essência, só existência... Inclusive - disparei - você tem que assumir que não é mais virgem!" E ela, com boca de nojo: "Eu sabia que você ainda ia jogar isso na minha cara!!!" E fugia pelas escadas.

O medo era a barriga, medo que a pílula matou anos depois, mas era medo também de um labirinto de liberdades assustadoras, de apego a vestidos de debutantes, organdi branco, a véus de noiva esvoaçando nas almas românticas.

Ninguém dava. As poucas que o faziam eram apontadas pelos rapazes, com fascínio e suspeita, um respeito desconfiado. Quantos teriam coragem de casar com elas? Lembro de uma menina da universidade que entrava num transe meio epiléptico, de olho virado em alvo, que "dava" num sacrifício ritual de gritos e choros do qual acordava sem lembrar de nada... Era um sucesso entre comunas caretas, uma espécie de "louca da aldeia". Por isso, homens falando em "liberdade" viviam em "rendez-vous" e em aventuras com mulheres casadas, infelizes matronas (uma que levei ao "aparelho" chorava pelo marido militar e gemia de vingança: "Ele odeia comunistas... ahh... se ele soubesse...").

Ou então eram pobres empregadas carentes, "lúmpens" de rua (como se dizia); um companheiro nosso papou até uma cega do Instituto Benjamim Constant. E havia também o recurso a mulheres turistas e estrangeiras. Um comuna amigo meu "traçou" uma funcionária do consulado americano, a quem ele obrigava a chamá-lo de "Fidel Castro" (esse já foi até ministro...).

Tudo era complicado, proibido, ao som do rock e bossa nova. Éramos assim em 1962.

Aos poucos, melhorou... Em 63, conheci minha primeira grande paixão, minha vertigem e cegueira, pois, antes da pílula e sem recuos, ela tinha adentrado gloriosamente o "aparelho" secreto do Partidão na Rua Djalma Ulrich e, em meio a livros da Academia de Ciências da União Soviética, sob um pôster de Lenin e uma reprodução dos Girassóis de Van Gogh, "dera" para mim com amor e coragem. Foi um raio de triunfo em minha juventude. Lembro até hoje que, lá embaixo, na loja de discos, tocava o sucesso da época, "Chove Chuva Chove sem parar...", com Jorge Ben (ou seria Bicho do Mato?) Não sei. Mas, até hoje guardo na alma aquela tarde mágica e revolucionária de 63, com música do Jorge ao fundo, com a mulher com quem vivi até 69, ano em que ela resolveu me abandonar por outro, quando o grande sucesso musical era também de Jorge Ben: "Sou flamengo e tenho uma nega chamada Thereza...", o que fazia esse jovem comuna chorar pelas ruas, ao ouvir seu nome nos rádios e nas esquinas...

sábado

Canibal

Gostaria de expressar - a você - meu amor, minha saudade. Quando deito e te vejo... Arrepia-me tanto! Calafrios, não assim tão frios, ao te desejar. Disco teu número: vou lhe contar, como na ultima vez: 'te quero tanto'.
- Não serás objeto. Serás humana. No café da manhã, te tomarei. No almoço, te devorarei. A noite entrelaçarei-te em meus cabelos, engolindo a paixão. Fogo perverso, te quero... tanto.

Mas não atendes. Não respondes.

quarta-feira

reflexiva

- quando você tira você de uma pessoa, o que sobra é a pessoa e nada mais.
então, você pode ver realmente como ela é.





pense mais,
use o cérebro.

domingo

Espetáculo de mágica

' We're all stars now in the dope show
There's lots of pretty, pretty ones
Who want to get you high
But all the pretty, pretty ones
Will leave you low
And blow your mind '


[ thedopeshow - MM ]








Tire seu chapéu da década de vinte, reverencie a todos como se estivesse agradecido! Você os ouve (yeah! yeah! Magnifique! Splendid!) e quase os ama.
Infelizmente, quase os ama não significa amor. O único que você ama, enfim, é a si mesmo.

Você?! Amar somente a si mesmo?! - Mas eu sou uma pessoa tão boa! - Amo minha mulher, amo meus filhos, amo meu gato, cachorro, canário! - Amo minha casa, amo meu dinheiro, amo minha boneca inflável! - Posso ouvir você pensando, ou até mesmo exclamando isso alto.

(então me diga: se alguém morresse, você não morreria... mas se você mesmo morresse, você não viveria, certo?)

Todos nós ficamos pensando em nossa vida como se fosse algo importante, como se tivéssemos um motivo para existir, uma missão, um destino, algo oculto (sinta a mágica, sinta os espíritos, sinta o tarot, sinta os gnomos)!
Vejamos: somos animais, somos irracionais, continuamos sempre tentando lutar contra uma afirmação que, quanto mais procuramos destruí-la mais ficamos encurralados: "Somos, acima de tudo, um bando de animais."
Pensamos nos nossos amores, na nossa vida, juramos não muito amor próprio e excesso de amor por outros. Se, nem ao menos nos amamos o suficiente, quem dera amar a outro alguém. Egoístas, enganadores (de si, de outros), somos mágicos natos em cena.

E como gostamos de enganar...

E como gostamos de estar na platéia para sermos enganados!